Editora: Carambaia
Acabamento: Brochura com orelhas e cinta
Cor do miolo: preto
Formato: 13 x 20 cm
Páginas: 208
Edição: 2ª
Ano: 2022
Idioma: Português
Classificação: não disponível
Categorias: literatura, romance
“Eu sou isto: esta terra, e a tenho no sangue. Veja minha cor: parece que a terra soltou tinta em mim e em você também. Esse país é o quinhão dos homens pretos, e todas as vezes que tentaram tirá-lo de nós podamos a injustiça a golpes de facão.” O país é o Haiti e quem fala é Manuel, o protagonista de Senhores do orvalho, de Jacques Roumain (1907-1944), traduzido por Monica Stahel, quase sete décadas depois de sua primeira e única edição no Brasil.
Manuel é um lavrador que volta a seu povoado, Fonds-Rouge, depois de quinze anos nas plantações de cana-de-açúcar em Cuba, período em que conheceu a auto-organização dos trabalhadores e participou de uma greve. Ao voltar para a casa dos pais, encontra-os vivendo privações severas num ambiente castigado pela seca. Manuel é recebido com uma cerimônia vodu de boas-vindas em que ocorre uma briga de loás (divindades do vodu), sinalizando a iminência de um conflito. O herói logo perceberá que a vizinhança é marcada por uma divisão entre grupos hostis, originada por uma antiga disputa de terras de família, que acabou em duas mortes.
O primeiro desafio de Manuel será procurar uma nascente de água para criar um sistema de irrigação que volte a tornar férteis as terras de Fonds-Rouge. O segundo é vencer a resignação e a desconfiança mútua no interior da comunidade e unir seus integrantes em torno do trabalho agrícola, requisitos para fortalecê-los frente aos inimigos que representam as elites mestiças: violentos guardas rurais e comerciantes exploradores. A possibilidade de cooperação é simbolizada pelo modo tradicional de organização coletiva do trabalho, pontuado por música e dança – o coumbite. Os conflitos se aprofundam quando Manuel se apaixona por Annaïse, do ramo rival da família, desencadeando um romance ao estilo Romeu e Julieta.
Senhores do orvalho foi lançado originalmente em 1944, pouco depois da morte do autor, e é considerado o romance fundador da literatura haitiana moderna, tematizando os elementos fundamentais do cotidiano do povo negro em sua luta por sobrevivência. Estão presentes a agricultura de subsistência, a religião vodu, a cultura africana reprimida pela elite mestiça e, sobretudo, a natureza violentamente devastada, que se eleva da trama com tanta força e complexidade quanto os personagens. Com estrutura aparentada à fábula e aos mitos fundadores, é também uma obra engajada, marxista, às vezes quase programática, sobre as possibilidades de emancipação de uma maioria oprimida pela via do trabalho.
A literatura de Roumain é reconhecida por ter introduzido uma voz haitiana própria, ao evocar os ritmos e sonoridades da língua crioula – uma elaboração buscada pelos intelectuais autointitulados indigenistas. Como observa no posfácio a pesquisadora Eurídice Figueiredo, da Universidade Federal Fluminense, “os dois elementos culturais mais fortemente rejeitados pelas classes letradas eram o vodu, considerado uma superstição a ser eliminada, e a língua crioula, considerado um patois, um dialeto que os falantes praticam mas do qual se envergonham”. Foi no vodu e no crioulo que os indigenistas encontraram a linguagem e a cosmologia particulares da literatura haitiana, que já nasceu moderna ao recusar as formas oficiais de comunicação.
Senhores do orvalho, traduzido em dezenas de línguas, inspirou dois longas-metragens, um homônimo, de 1974, feito para a televisão francesa, e outro intitulado Cumbite, de 1964, dirigido pelo mais importante cineasta cubano, Tomás Gutiérrez Alea.
Saiu na imprensa:
"Senhores do Orvalho, uma obra fundamental da literatura haitiana."
José Godoy, Rádio CBN, 22/09/2020
"Jacques Roumain, escritor, político e etnógrafo, morto em circunstâncias misteriosas, apresenta a narrativa de um exuberante Haiti, que ecoa natureza e histórias quase míticas."
Itamar Vieira Jr., Folha de S.Paulo, 25/09/2020
"A diferença e semelhança entre a posição do narrador e a do autor transpassam este romance haitiano, mas também traz num só golpe todo o debate da ciência da literatura: Romain não é Manuel (protagonista de Senhores do Orvalho), mas Romain assume a matéria nacional do Haiti tal como Manuel: distante há muito tempo, reconhece-se na terra natal, mas guarda um desconforto com ela; ao mesmo tempo nostálgico e científico. Pela procura em estar de volta à sua terra, Romain surge para mim (leitor e crítico) como um narrador participante e espectador distanciado, não há como vê-lo de outro modo."
Caio Sarack, Estadão, 05/12/2020
"Ao voltar para a casa de seus pais, ele encontra um povoado devastado pela miséria e pela seca: “tudo o sol havia lambido, apagado com sua língua de fogo”. Antes da morte de seu avô, as árvores de Fonds-Rouge eram densas, e a vizinhança vivia em harmonia. Unidos como os dedos da mão, reuniam-se para a colheita e o arado através da organização coletiva, conhecida como coumbite."
Leonardo Nascimento, Suplemento Pernambuco, novembro/2020
"Uma das obras fundadoras da literatura haitiana, 'Senhores do orvalho' é uma história de valorização da cultura negra do Haiti, de sua língua, sua paisagem, sua tradição e religião, o vodu."
Cadorno Teles, Ambrosia, outubro/2020
"O livro, de 1944, é tido como o marco inicial da moderna literatura haitiana. Escrito originalmente em francês por Jacques Roumain, 'Senhores do Orvalho' tem pontos em comum com o escritor brasileiro Graciliano Ramos, especialmente com Vidas Secas, publicado em 1938."
Redação, Estadão, 22/10/2020